Abstract:
Nesta pesquisa procuro analisar as experiências que as pessoas têm do “fique em casa” e as
respostas dadas pelos residentes do bairro 16 de Junho à esta medida preventiva, considerando
os seus espaços habitacionais e os espaços de busca de alimento diário. A partir do mês de
Março de 2020, Moçambique passou a colocar em sua agenda o desenho de políticas de saúde
e políticas públicas para reduzir a ocorrência dos casos de infecção pelo SARS-CoV-2, o vírus
que causa a Coronavirus Disease 2019 (COVID-19). Neste âmbito, para além de medidas
como o uso de máscaras, higienização das mãos e objectos pessoais usados regularmente,
adoptou-se o “fique em casa” como uma das medidas para a redução do risco de infecção pelo
SARS-CoV-2. Alguns estudos realizados referentes à análise da implementação destas
medidas e sua relação com os modelos de habitação em Moçambique, mencionam que no país
o problema de habitação é um aspecto que deve ser tomado em conta para compreender a
exequibilidade da medida preventiva (SAMBO e JÚNIOR, 2021). Orientada pela
fenomenologia, como referencial teórico e articulada ao método etnográfico, a pesquisa fornece
evidências de especificidades subjectivas em relação ao cumprimento do “fique em casa”. Os
resultados do estudo indicam que o espaço habitacional assumido como espaço fluído (parte
das relações e necessidades das pessoas) remete a uma desconstrução de toda uma ideia de
possibilidade de se manter em casa. Ademais, (i) a rua como local de busca de sustento diário
caracteriza-se por um espaço de conflitos entre os cidadãos e a polícia municipal, microcosmo
assinalado por um conflito social cuja face mais marcante na minha pesquisa caracteriza-se
pelo conflito entre o vendedor informal e a polícia municipal; (ii) o corpo, quando submetido
a situações de fome, torna-se um corpo controlável mediante práticas de apoios e ajudas sociais.
Assim, a fome e a casa fazem do “fique em casa” uma medida preventiva com características
que depende das condições existentes em cada contexto